sábado, 30 de maio de 2009

O ETERNO SWING DE BENNY GOODMAN



O mundo do jazz comemora hoje os cem anos de nascimento do Rei do Swing. Benny Goodman, de pais judeus, nasceu em 30 de maio 1909, em Chicago, e com ele jazz e música popular tornaram-se a mesma coisa para urticária dos jazzólilos renitentes puristas e alegria dos ouvidos de qualquer cidadão médio do mundo.
Por vários motivos, para a música norte-americana, Benny Goodman tem a mesma importância que o Clube de Regatas Vasco da Gama para o futebol brasileiro. O Vasco foi o primeiro clube a profissionalizar jogadores negros e com eles disputou e venceu o campeonato carioca de 1923. O senão é que, ao que me lembre, não se tratavam aqueles atletas de nenhum estupendo craque como o foram, ao seu tempo, Leônidas, Pelé ou Dener. Já Goodman escalou de pronto verdadeiras “feras” do jazz para acompanhá-lo em sua Big Band ou em seus combos. Por lá desfilaram, para se ter uma idéia, Billie Holiday, Lionel Hampton, Teddy Wilson, Cootie Williams, Sid Catlett e Charlie Christian, apenas para citar os instrumentistas negros.
Com a atitude contribuiu para superar o cancro da segregação racial na sociedade norte-americana. É verdade que, por exemplo, seus músicos de cor, muitas vezes, após as apresentações, tinham que dormir em ônibus de excursão porque eram rejeitados nos hotéis, nunca jamais sem realizar protestos. Billie Holiday sofria a bessa com isso, mas protestava à altura contra tal escárnio. Entretanto, o que cabe salientar é que Goodman sabia como poucos escolher seus acompanhantes e foi por isso um genuíno formador de músicos, e dizem que o fazia com extremo rigor. Qualquer deslize de comportamento nas apresentações era bilhete azul no dia seguinte.
Somente ter isso no currículo já o colocaria no pantheon do jazz para sempre, mas foi além. Foi o grande responsável pela popularização do jazz, ao protagonizar o estilo swing. Com ele o swing, além de ser música de salão e pra dançar, conheceu o ápice do estilo também por causa do apuro de sua técnica - talvez uma das clarinetas mais limpa e emotiva ouvidas no jazz. Creio que a formação de músico erudito deve ter contribuído para tanto, mas o quê da questão era o modo como realçava a forma da execução jazzística.
Na verdade, é a tensão provocada pela mistura dos padrões musicais europeus e africanos que fazem surgir o swing. Falo aqui do swing enquanto ritmo e que é próprio a todos os estilos de jazz. Músico que não swinga não produz jazz. O fato é que o swing posto em prática a partir de Benny Goodman fez a cabeça e os pés de toda uma geração de jovens com magia e alegria sem abrir mão do verdadeiro espírito do jazz.
Um outro aspecto que evidencia a presença do swing no dia-a-dia de qualquer cidadão, pelo menos para os que nasceram a partir de meados do último século, pode ser observado nos desenhos animados vistos por gerações e que funcionam como verdadeiros educadores de ouvidos para o jazz. É só assistir a quaisquer episódios de Tom and Jerry ou Bete Boop, por exemplo. É jazz no estilo swing do começo ao fim. O swing é sinuoso e contagiante. Quanto a isso Charlie Brown é fantástico e encantador, só que diferente. Entretanto, deixaremos ao largo, pois põe em relevo o jazz biboperano que não está no escopo desta análise.
Vendo assim, fica fácil constatar que foi um privilégio ter sido criança nessa época, pois seus ouvidos eram premiados com a estética de uma música de beleza e tão bem construída. Mas a ótica da animação também nos permite divisar a própria evolução da música que informa o jazz. E quem divisa o futuro, nesse sentido, é o próprio Charlie Brown que aponta a cena seguinte e nos remete ao esgotamento do swing, talvez por que tenha se popularizado demais ou sua forma tenha se exaurido na repetição.
O fato é que o interesse dos músicos mais criativos de então se volta para a formação de pequenos grupos e provoca a radicalização maravilhosa que deu no Bebop e inaugura o jazz moderno. Jazz de energia, rapidez e fluência produzindo acordes e um fraseado novo. Assumem a cena principal Charlie Parker, Dizzy Gillespie, Thelonious Monk, Miles Davis… Cerram-se os panos do proscénio, a ribalta das orquestras…
Pensando bem, basta ouvir Don’t Be That Way, Body And Soul, Alone Together, Sweet Lorraine, Blue Skies, The Man I Love, Avalon, Blue Reverie e Sing, Sing, Sing para que se saia por aí dançando e fazendo piruetas no ar. É por que se sabe afinal que a música legada por Benny Goodman é eterna e comove o espírito de qualquer um em qualquer tempo. É só deixar a música falar ao coração que ela arrasta a mente e também o pé.

_____________________________________

Dedico este artigo ao avô de meu amigo Gilberto Naeydi, Raimundo Lago.
Homem de grande valor doou parte de seu tempo à benevolência no Asilo de Mendicidade, em São Luís. Entusiasmava-se ao ouvir as Big Bands, creio que se lembrando dos bailes de sua juventude onde certamente conhecera o seu amor e o swing. Pude conviver com seu Raimundo algumas vezes, ouvindo discos de jazz (só big bands) e ele deliciava-se e espantava-se como alguém tão novo poderia gostar de uma música tão velha. O que alimentava seu coração consumia minha alma e essa era a única resposta para sua indagação. Saudades de algumas manhãs na sua casa da Rua das Criolas, no centro, ou na casa dos Flamboyans do Recanto dos Vinhais de meu compadre Gil.

domingo, 17 de maio de 2009

O GENIAL CAPITÃO HERBIE HANCOCK



A propósito do artigo "A Balada do Mar Salgado", que põe em evidência a importância do compositor Herbie Hancock para a cena do jazz, é necessário chover no molhado. O texto é profícuo e permite um passeio por cada música do disco Maiden Voyage, de 1965, revelando a maestria da construção de cada faixa de um disco clássico e de grande destaque na carreira de um dos mais ousados músicos do cenário atual do jazz.
Como todos leitores-ouvinte ressaltaram, Hancock é genial nota por nota que sai de seu piano. E o é também a partir da generosidade de ressaltar a participação envolvente de cada um dos membros do combo. Não há vaidades e cada músico pode desfilar, digo mais uma vez, nota por nota a possibilidade do improviso e assim expor o requinte de sua técnica.
Esse resultado harmônico desejável, no entanto, é difícil de ser atingido no jazz. É aqui que reside o ardil da batuta do músico-lider e demonstra-se a funcionalidade e a virtual genialidade do líder do combo. Um excesso no controle dos membros pode arruinar a fluência rítmica, assim como se torna perigoso permitir a sobressalência desmedida de egos dos músicos. O resultado, nesse caso, geralmente é a destruição do sentido harmônico do grupo. Quando isso ocorre, literalmente, jaz e fim de papo.
Na formação de trio, quarteto ou quinteto como nesse caso, principalmente, é a atitude de saber dosar egos com controle flexível que revela as qualidades do verdadeiro capitão do jazz de que bem falou Érico Cordeiro no seu último post no blog Jazz+Bossa+Mais Baratos Outros ao tratar da obra Maiden Voyage. Fica evidente, ao ouvir-se o disco, que Hancock, além da belíssima e apurada técnica pianística, tem esses predicados que o tornam, no dizer de Érico, um grande capitão. Ali controle e egos estão coadunados a serviço da boa música e o que se vê é um equilíbrio de virtuoses, produzindo um encontro singular e significativo que tornam a obra atemporal. Não poderia deixar de mencionar que os responsáveis por essa performance são os fantásticos músicos Ron Carter (baixo), George Coleman (sax tenro), Tony Williams (bateria) e Freddie Hubbard (trompete). Todos acompanhavam também Miles Davis. O encontro dessa confraria dá a dimensão da dificuldade da tarefa e a relevância dos resultados obtidos por Herbie Hancock. Com tanto talentos assim reunidos nessa gravação, solos e improvisações acontecem a todo o momento. Agora, aos mares marujos! Quer dizer: já ao disco.

quarta-feira, 6 de maio de 2009

DELICATESSEN: MY BABY JUST CARES FOR ME


Estão todos convidados a ouvir My Baby Just Cares For Me, segundo CD da banda de jazz Delicatessen, gravado entre julho e agosto de 2008, em Porto Alegre.
O novo trabalho do grupo, produzido por Beto Callage e Carlos Badia, valoriza mais o jazz que o CD de estréia, Jazz+Bossa. Naquele, come-se quase sempre com a dissonância que a bossa nova fez parir no samba. Os arranjos são enxutos, econômicos, delicados e são desses elementos que surge sua beleza. Também é um grande disco, tanto que já vendeu mais de 20 mil cópias aqui no Brasil e no exterior, principalmente, no Japão. Por ser totalmente independente, isso já é uma verdadeira façanha; tanto mais quando se levam em conta as dificuldades de distribuição e divulgação, mesmo nos escassos programas de jazz em nosso rádio. O trabalho da banda ganhou notoriedade através dos shows pelo país e do uso da internet por meios de blogs e do My Space.
Mas sempre fica a expectativa por parte da crítica para se saber como o artista vai-se sair em seu segundo trabalho. Principalmente, se o primeiro foi coberto de sucesso, pois não é raro surgir trabalhos irregulares que produzem descontinuidades ou hiatos na carreira do artista.
No caso do Delicatessen essa regra foi totalmente quebrada de forma positiva, pois o disco é bom de cabo a rabo. Chamam atenção em especial mais uma vez a elegância da execução e da técnica de Carlos Badia ao violão e o disposto, às vezes contido, e tão belo baixo de Nico Bueno.
Confesso que fiquei curioso quando soube do título disco. Isso porque Nina Simone interpretou my baby just cares for me, numa gravação histórica, cheia de emoção e definitiva. Fiquei pensando: o que será que Ana Krüger vai aprontar com a canção de Gus Kahn e Walter Donaldson? Pensei ainda: essa moça é corajosa! E logo lembrei de Elis Regina. Da sua incrível capacidade de tornar interpretações suas imortais, inesquecíveis e únicas. Elis gravou, tchau! Não dava mais pra ninguém. Era duro até para outras grandes cantoras deixar sua marca. Pois já ouvi muita gente grande derrapar quando se trata de reinterpretar. Algumas músicas parecem, na verdade, que foram feitas para só uma única voz. Têm somente uma dona e as demais intérpretes sempre caem na armadilha de copiar a expressividade do canto singular. Ai acalmei-me: pelo menos ambas são gaúchas como se isso fosse certificado de garantia.
Mas Ana Krüger não deixou por menos: fez uma interpretação diferente da composição e ali seu canto nos deixa alegres e leves. Dá um novo sentido à canção em grande interpretação. Tudo isso se torna ainda mais relevante porque, como soube, a cantora canta jazz há pouquíssimo tempo e, ao ouvi-la, tem-se a impressão de estar-se defronte de uma veterana. A emissão da voz é perfeita e a técnica vocal é executada com naturalidade. Como se não bastasse, corrobora tudo isso nas faixas Be Careful, It’s My Heart de Irving Berlim e My Foolish Heart, dos compositores Victor Young e Ned Washington, também pontos altos do disco. A música do Delicatessen é delicada e se você ainda não ouviu, sugiro-lhe reforçar sua cedeteca com os dois CD’s. Bom proveito!

sábado, 2 de maio de 2009

O MARKETING DO OCO DO MUNDO


O Shopping São Luís, no Jaracati, está revolucionando o marketing. Só que às avessas. Resolveu cobrar dos frequentadores pelo estacionamento. Depreende-se que, em tempos de crise, ou a administração do shopping não dá a mínima para isso ou os clientes devem estar trombando no interior do prédio, sendo necessária, portanto, a cobrança como forma de melhor controlar o fluxo.
O objetivo deve ser, se possível, diminuir o número dos compradores. Sim, porque, só dessa forma pode-se entender a eficácia da medida. De outra forma, é pra se pensar: os proprietários das lojas devem estar dando pulos de alegrias, afinal, agora venderão bem mais porque os clientes que entrarem terão mais tempo e espaço para escolher as tais mercadorias e seguramente maior atenção dos vendedores, pois a briga para atender agora vai ser a tapas.

Para piorar, conforme divulgou o blog de Anselmo Raposo, o ruim mesmo é na hora de pagar a taxa. Filas, confusões... e desperdício do tempo dos clientes. Escabreado, passei lá ontem à noite, deixei meu filho no cinema e fugi pra bem longe. Espero que mais gente faça o mesmo. O marketing por aqui é o do oco do mundo!