quarta-feira, 20 de outubro de 2010

EM ENTREVISTA AO SITE VERMELHO FLÁVIO DENUNCIA FRAUDE NAS ELEIÇÕES NO MARANHÃO


Flávio Dino denuncia fraude e questiona posição do PT no Maranhão
Disputar uma eleição no Maranhão contra a família Sarney não é tarefa fácil para nenhum postulante ao Palácio dos Leões. Mas, Flávio Dino não se intimidou nem mesmo quando soube que não teria o apoio do PT nacional. Aos poucos, ele foi conquistando adesões por todo o estado até quase chegar ao segundo turno. Nesta entrevista, o deputado federal fala sobre sua experiência e volta a denunciar o intenso uso da máquina e os abusos do poder econômico, “intensamente utilizados pelo grupo Sarney”.

Vermelho: Como avalia o processo eleitoral no Maranhão?


Flávio Dino: Acho que esta análise deve levar em conta fatores nacionais e locais. No primeiro caso, tivemos uma grave dificuldade que foi a decisão da direção nacional do PT de intervir no Maranhão e isso nos tirou tempo de televisão e agudizou as dificuldades que já haviam, postas pela assimetria material. Ela (Roseana Sarney) tinha uma estrutura gigantesca, está no comando do estado, faz parte de um grupo poderoso. Isso foi um fator determinante para esses oito centésimos que faltaram para a definição ir para o segundo turno. Já na cena local, destaco dois aspectos. Primeiro, o campo da mudança, de quem quer ver o estado andar para frente, é majoritário no Maranhão e a nossa candidatura conseguiu representar esse sentimento, o que fez com que saíssemos de um patamar bastante baixo, de um dígito, e chegássemos à ante-sala imediata do segundo turno, com 30% dos votos. O segundo aspecto diz respeito ao intenso uso da máquina, aos abusos do poder econômico, do poder político, a fraude eleitoral, a corrupção, a compra de votos, todos esses fatores ilícitos que foram intensamente utilizados pelo grupo Sarney.

Vermelho: E diante desses fatos, há alguma iniciativa sua ou do partido para buscar justiça?


FD: A princípio, vamos aguardar a iniciativa do Ministério Público porque são fatos públicos e notórios, noticiados inclusive pela imprensa nacional. Há, por exemplo, quitação de contas de água e luz feita pela campanha dela em diversos bairros e municípios, quitação em massa em proveito de eleitores. Isso tudo está documentado, tem a ação da polícia. Então, nossa atitude, num primeiro momento, é a de denunciar politicamente que não foi uma eleição normal; foi uma eleição desigual, ilícita. Ao mesmo tempo, vamos aguardar que as instituições do estado – no caso o MP e a Justiça Eleitoral – tomem as providências necessárias.

Vermelho: Se houver ações por parte dessas instituições, em que elas podem resultar?


FD: A rigor, se o Ministério Público considerar que esses fatos são graves – e na nossa avaliação, eles o são – poderia levar até mesmo a uma nova eleição, juridicamente falando.

Vermelho: Como avalia o comportamento do PT no caso das eleições maranhenses?


FD
: O PT do Maranhão foi exemplar. Ele decidiu apoiar minha candidatura, apesar da intervenção nacional. A imensa maioria do PT no estado fez campanha para mim, tanto na capital quanto nas cidades do interior; presidentes de partido, lideranças sindicais e populares, entidades sindicais dirigidas por petistas aderiram à nossa campanha, inclusive dirigentes da CUT estavam majoritariamente na minha campanha, dirigentes da Federação dos Trabalhadores da Agricultura do Estado Maranhão (Fetaema) etc. Não tenho queixas em relação ao PT do Maranhão. Foi uma minoria que ficou efetivamente com a Roseana. Agora, a direção nacional do PT, na minha avaliação, não respeitou o que o PCdoB representa nessa aliança desde 1989 porque a intervenção feita no Maranhão foi a única no país contra um aliado histórico e contra um deputado que teve, nesses últimos quatro anos, um desempenho muito leal ao governo, e isso, infelizmente, não foi levado em conta. Creio que este seja um tema que deve ser levado para a presidência do PT: por que há dois pesos e duas medidas quando se trata do PCdoB?

Vermelho: Em que momento você acha que finalmente será possível haver uma quebra nessa situação vivida pelo Maranhão?


FD: Acho que o resultado da eleição poderá levar a um reposicionamento da direção nacional do PT. Sou um otimista e sempre acredito que há uma evolução no desenrolar dos fatos políticos no Brasil. Acho que o resultado no Maranhão evidenciou o quanto foi artificial a atitude tomada contra a nossa candidatura. O apoio do PT ao grupo Sarney é incompatível com a própria lógica histórica do desenvolvimento do estado. É insustentável uma situação em que você tem um grupo que domina a cena política de um estado há praticamente cinco décadas e esse estado é o que tem os piores indicadores sociais do Brasil. Durante a campanha, debati exaustivamente este aspecto e cobrava deles: “olha, vocês estão dizendo que querem uma nova chance, uma nova oportunidade, mas por que não fizeram antes, se tiveram todas as oportunidades?”. E colocava para os eleitores: “esse pessoal teve oportunidade de desenvolver o estado e se mostrou incapaz de fazê-lo e não será agora que fará”. E não fará mesmo porque o projeto deles tem um vício de essência: na verdade, eles governam para os grandes; acreditam que são os grandes projetos que supostamente irão redimir e salvar o Maranhão e isso faz com que eles adotem uma estratégia de desenvolvimento totalmente dissociada da maioria da sociedade. Tanto é que as zonas mais dinâmicas da economia maranhense votaram pela mudança, ou em mim ou no Jackson (Lago, ex-governador e candidato do PDT); não votaram nela. Seus votos são essencialmente da máquina, do abuso do exercício do poder político e econômico. Passadas as eleições, creio que – até pela cobertura que a imprensa nacional fez – a direção nacional do PT reposicionará sua tática em relação ao Maranhão e tentará, progressivamente, a partir do próximo governo – que espero ser o da Dilma – fazer com que haja maior respeito pelas forças progressistas, democráticas e populares do Maranhão.

Vermelho: Apesar de conhecer o Maranhão, suas andanças pelo estado durante a campanha te mostraram algo que te surpreendeu?


FD: A campanha é uma imensa escola, é como se fosse uma pós-graduação intensiva em política. Este é o lado indiscutivelmente positivo. Hoje, me sinto mais preparado, mais qualificado, mais apto a ajudar a exercer um papel de mudança no Maranhão justamente por este aprendizado. Para mim, campanha tem dois aspectos a serem destacados. Um deles é o aprofundamento do conhecimento das realidades regionais. Na verdade, o Maranhão é um estado muito grande, tem 331 mil quilômetros quadrados e regiões com dinâmicas muito próprias, como se tivéssemos muitos estados dentro de um só. E na medida em que visitamos as comunidades, dialogamos mais e distinguimos mais claramente essas singularidades microrregionais.

E há, também, um saldo emocional da campanha. É inevitável não se emocionar com as inaceitáveis injustiças que marcam o cotidiano dos maranhenses. Atravessar uma campanha dessas nos deixa mais indignados. Vi muita pobreza, exclusão, negação de direitos que, evidentemente, eu sabia que existiam, mas uma coisa é o saber teórico, outra coisa é o contato prático, vivo, com essas pessoas. Por tudo isso, sinto-me ainda mais motivado porque não se trata apenas de racionalizar uma realidade social, mas também de sentir as dores do povo como dores suas, se indignar, saber que aquilo pode e deve ser diferente e transformar essa indignação em energia criativa e transformadora. E essa é uma atitude, sobretudo, política, porque nos faz mover forças que consigam transformar esse sentimento de indignação em transformação concreta. Lógico que gostaríamos muito de ter ganhado – e os militantes, em geral, heróis anônimos da luta pela democracia, mereciam essa vitória. E é lógico também que a derrota deixa um travo amargo na boca, superado por essa leitura de que a vida continua. Nós continuamos com a nossa ação política e no meu caso particular, sinto-me mais qualificado. Precisamos extrair lições de tudo isso, sem perder a motivação.

Vermelho: Como será a atuação de Flávio Dino e do PCdoB local no segundo turno?


FD: Evidentemente, mantemos nossa posição política, apesar da situação indesejável que se criou. Não podemos perder a perspectiva política mais geral do que é melhor para o Brasil. Por isso é que na entrevista que dei já no dia seguinte ao segundo turno, eu já dizia que o partido do Maranhão sempre esteve e continua estando na campanha com Dilma Rousseff.

Vermelho: Em 31 de janeiro, se encerra o seu mandato como deputado federal. Quais são seus planos para depois?


FD: Primeiro, eu lamento muito deixar a Câmara porque é um espaço de atuação política que me ensinou muito e ao qual me dediquei muito nesses últimos quatro anos. E o que sinto é, de fato, a dor de uma perda, de algo que vai deixar saudades. Agora, é preciso entender que esse “sacrifício” era necessário em razão do momento político do Maranhão. Nunca coloquei as zonas de conforto pessoal na frente da minha missão política; quando deixei de ser juiz, foi em razão disso. Renunciei a um cargo que me trazia conforto familiar e pessoal e que exerci por 12 anos e de que gostava muito porque era necessário, na minha avaliação, ajudar a recompor o quadro partidário no estado. Da mesma forma agora: eu poderia ter sido candidato à reeleição; muitos diziam que seria fácil – eu discordo, porque toda eleição é difícil – mas, digamos que até matematicamente seria mais fácil na medida em que para deputado federal são 18 vagas e para governador, apenas uma vaga. Mas, nunca coloquei o conforto pessoal na frente e não me arrependo disso.

O que fazer depois disso depende mais do partido do que de mim porque sou presidente estadual do PCdoB e sempre disse em meus discursos que não sou político profissional; sou advogado e professor, e sempre vivi das minhas profissões desde muito jovem. Então, a princípio é isso: retornar ao exercício das minhas profissões e aguardar outras missões políticas que serão definidas coletivamente. Não reivindico rigorosamente nada para mim porque acho que não sou credor de ninguém. Acho, na verdade, que sou devedor porque ter disputado o governo, apoiado pelo meu partido, pelo PPS, PSB e PT, é uma honra.

Destaco que o PCdoB é uma força crescente no Maranhão e tenho muita alegria de ver a quantidade de novas lideranças que se incorporam à política, vindas de outros segmentos da sociedade; isso me orgulha muito. E o PCdoB, não tenho dúvida, em razão desse excelente resultado eleitoral de 2010, sempre estará sentado à mesa das decisões políticas do Maranhão, sem hegemonismos ou exclusivismos, pelo contrário, com muita humildade valorizando os aliados. E o PCdoB sempre estará sentado à mesa do lado certo, do lado daqueles que querem a mudança, que lutam contra as injustiças, que denunciam as práticas oligárquicas, as desonestidades, porque estar sentado do lado errado dessa mesa não nos interessa; vamos continuar cumprindo este papel no estado e acreditando que nós, em conseqüência desse processo de acúmulo de forças, vamos extrair excelentes resultados eleitorais em 2012 e 2014.


Da redação,
Priscila Lobregatte

sexta-feira, 15 de outubro de 2010

O ESTRATEGISTA


Pensou por um momento como se fossem dias. Já estava tudo definido e tão certo. Foi quando andava a esmo por quaisquer ruas, esbarrando em busca de uma a memória tardia que não valorizava mais. Vivera há muitos, arrastando-se por tantos lugares e por anos a fio e ainda agora, deixando atrás de si apenas marcas de seus passos, que logo eram devorados pelo vento que lhe gelava as carnes e a alma. Não se importava mais com as coisas, os cheiros, os gostos, os jeitos e rostos emaranhados na confusão de seus pensamentos. Tudo lhe parecia sem sentido. Era como que se na vida não tivesse havido momentos determinantes, ou tudo que houvesse vivenciado até então, agora, descobrisse ter-lhe fugido com a velocidade de um estalar de dedos: zap! vulpt! Para, no instante seguinte, reafirmar que o tempo não voltava mais como as marcas de seus passos agora definitivamente enterrados e esquecidos pelo tempo.

Sentiu medo, um frio na barriga e um enorme estranhamento de gelar a espinha, pois desconhecia tudo e só com muita força lembrava os amigos, namoradas, pais e seu mais adorado cão. Pediu pra si mesmo paz e saiu gritando até ficar adormecido e inerte, torcendo para ser esquecido. Achou que tinha enlouquecido; ou seria ele que talvez houvesse esvanecido sem saber?

Por via das dúvidas e sem querer confrontar o tempo, passou a viver com a não-memória. Decidiu que só o presente imediato, o átimo, as relações do instante é que seriam bem-vindas, já que desconfiava que não pudesse chamá-los de vividas. Ajustou, assim, que os momentos fossem rápidos como piscar de olhos. Melhor assim, posto que não criavam vínculos, nem expectativas e tão-pouco obrigações, as quais detestava. Agora sua vida era uma “quase não experiência”. Não se importava. Afinal, por que deveria viver com coerência? Já não precisava mais se justificar e isso era em si uma grande vitória. Mas havia inconvenientes nesse procedimento; não conseguia conversar longamente com ninguém, o que lhe impunha conhecer e esquecer logo em seguida um monte de gente que depois lhes fugiam os nomes. Especializou-se em truques para disfarçar e lembrar nomes no meio dos papos. Às vezes só alongava as sílabas ou fonemas das palavras, quando era salvo da situação por alguém do lado que sem perceber lhe dizia o nome do interlocutor. Descobriu, assim, um lado útil das pessoas. Foi um fascínio para ele, algo de se gabar. Agora sim o veriam como importante e muito sábio, sem saber que na verdade aquilo era produto de sua desmemoria. Alguém muito útil para os dias que se vivem hoje. Muito útil aos outros e a si próprio. Agora que o sabia não ficaria pedra sobre pedra, sua vingança estava urdida e desenhada.