segunda-feira, 20 de outubro de 2008

NOITE DE ORGANZA



A noite mais fria do ano fez quando foste embora. Mal conseguiu dormir, semi-acordando de hora em hora como se a te buscar nas memórias. Ora a mão tateando cada extremidade do lençol que congelava no frio do quarto, ora debatendo-se contra teu corpo que só na sua imaginação existia.
Sonâmbulo, ainda, acordou e sentiu teu cheiro a recender no espaço. Aquilo lhe invadiu as narinas, produzindo um olor inebriante de saudade e trouxe à tona todos os gestos dos quais eram felizes cúmplices. E teus fluidos de suor ainda impregnavam as cobertas e também as roupas mínimas tuas que se foram ficando esquecidas pela cama e em todo quarto, espalhando-se por sua vida, como a se avivar a tua constante presença só naquela aparente desordem.
Disserte, então, de forma incompreensível, que só por isso irias embora. E estava feito e acabado. Irremediável. Então, acordou de sobressalto e suado, como quem acorda de um sonho estranho e pesado e viu que tudo era verdade. Na memória tudo era confuso e ficou sem saber o resto do dia o que ocorrera ao seu redor, de certo. E não compreendia nada, nem vírgula, ou como abreviar tua pausa. Tua distância. A ausência anunciada. Já tinha então decidido e não tinha mais jeito.
O relógio despertou de repente e lembrou do trabalho. Aliviou-se. Tomou banho e escovou dentes como de hábito. Serviu-se café e leu os jornais do dia. Pôs-se na ordem do dia.

Um comentário:

Anônimo disse...

Acabo de fazer uma visita de cortesia. Obrigado por ter visitado o Blog do Kenard. Abraços.